No dia 15 de maio de 2024, pelas 21h30, no Teatro das Beiras, na Covilhã, no âmbito do ciclo de programação Quartas de Teatro e inserido nas comemorações locais dos 50 anos do 25 de Abril, assistiram ao espetáculo 40 espetadores. Leram a Ana Monteiro, a Carlota Macedo, a Margarida Baptista, a Maria José Portugal, a Carla Almeida e a Maria José Morgadinho que aceitou o desafio de ir a cena ler as palavras de Salgueiro Maia. Tendo sido a primeira representação fora do Concelho de Viana do Castelo, havia expetativa acrescida no intérprete e no técnico “de serviço”, Tiago Fernandes. O intérprete registou que o espetáculo começou com uma atmosfera de alguma estranheza, quase frieza, por parte do público. No entanto, cedo a mesma foi superada e foi dando lugar a um ambiente de crescente empatia e partilha. Na parte do espetáculo dedicada a intervenções do público, Carlos Freitas levantou-se e partilhou que é um filho adotado da Covilhã, ele que nasceu na Trafaria. Revelou a sua condição de emigrante, classificando-se como um "vagabundo na Europa", que esteve no Ultramar, na Guerra Colonial. Com emoção, disse que foi uma experiência muito dura para quantos lá passaram e que, a título de exemplo, partilhou que se lembra de estar a falar com o amigo António sobre os sonhos de ambos, quando acabassem o período de tropa e que, uma hora depois, o jovem António já cá não estava. E que assim como aquele, na Companhia a que pertenceu, vinte outros jovens não tiveram direito a ter sonhos depois da guerra. Continuou dizendo que regressou de 28 meses em Angola, onde foi condutor de uma Berliet, tendo percorrido aquele país de norte a sul. Durante a guerra teve uma madrinha, a Orlanda, que era da Covilhã, com que se correspondeu por carta durante 3 anos. Quando regressou de Angola decidiu ir à Covilhã conhecê-la e contou como, de mão dada, decidiram construir um projeto de vida juntos. Depois emigrou para a Alemanha e disse que no estrangeiro considera que ganhou uma maior consciência do que é ser português. Perto da fronteira com a Suiça, está integrado numa comunidade em que vivem muitos portugueses, que são muito considerados pela comunidade local. Deu como exemplo dessa mesma integração o facto de os alemães naquela comunidade terem desejado festejar os 50 Anos do 25 de Abril com a comunidade portuguesa. Já depois de voltar ao seu lugar, quis acrescentar que apesar de ter ficado a ideia que no voto dos círculos eleitorais pela emigração, nas últimas eleições legislativas, se tert verificado uma grande votação na Extrema-Direita, ele é testemunha que na Alemanha e na França, muitos emigrantes portugueses votaram nos partidos do Centro. Seguiu-se o senhor António Baptista que se levantou e disse que precisava de falar porque estava muito tenso. Partilhou ter estado na Guerra Colonial em Moçambique entre 1969 e 1971. Acrescentou que passados 53 anos, ainda tem perturbações de sono e trauma, como interrupções violentas do sono. Que teve já acompanhamento. Afirmou que "não é treta o que está aí", referindo-se ao texto de Salgueiro Maia. Enfatizou a parte do texto que refere a sensação de estranheza que Salgueiro Maia sentiu quando regressou pela primeira vez a Lisboa, sobre o alheamento das pessoas face ao sofrimento da guerra. Revê-se nisso. Disse que também experimentou o mesmo sentimento. O contraste. Pois as pessoas aqui não tinham conhecimento do que lá se passava. O regime omitia e cerceava a informação sobre a situação real da guerra. Inclusivamente fazia propaganda de que valia a pena, economicamente, ir para a guerra, pois o salário dos militares destacados era transferido na sua grande parte para a então metrópole e os soldados recebiam uma pequena parte enquanto estavam em comissão de serviço, o que ajudava a criar a ideia junto das famílias que, ao menos, os jovens estavam lá a juntar algum dinheiro. Felicitou a Companhia pelo espetáculo e disse que não esperava reviver tantas imagens e sair tão perturbado.
Seguiu-se Celina Gonçalves que, na esteira do espetáculo, perguntou se o monólogo já tinha gravado pela RTP, tendo o intérprete respondido que não. Mas que a Companhia também não tinha propriamente tentado, lamentando aquilo que infelizmente todos os agentes culturais profissionais radicados fora dos centros urbanos em Portugal sentem: o centralismo nacional em termos de agenda noticiosa e de divulgação da Cultura, que só agrava, em vez de melhorar, muito em consequência dos orçamentos cada vez mais reduzidos dos meios de comunicação. Seguiu-se Brito Moura, que se levantou e veio à frente para dizer que no 25 de Abril de 1974 tinha 17 anos e estava em Coimbra. E que aí, em frente à escadaria monumental da cidade, num café, encontrou uma fotografia de Marcelo Caetano, virada ao contrário, com o vidro partido, e uma inscrição que dizia "encerrado para balanço" e que assim se apercebeu que a revolução era algo que já não tinha recuo. Partilhou ainda que estando ligado à assembleia de freguesia de Tortosendo, teve ocasião de estar numa vila francesa, perto de Lyon, que é geminada com a freguesia portuguesa e que aí se emocionou num encontro com emigrantes em que ouviu cantar, e cantou também, o hino nacional. Parabenizou a Companhia pelo trabalho. Depois deste momento, instados a comporem um conjunto de palavras para encerrar o momento e iniciar o próximo espetáculo, Jorge Henrique Santos propôs: “Sofrimento; Guerra; Paz; Liberdade.”; Dulce Pinheiro acrescentou: “Paz sim, guerra não.”; Rosa Simões disse: “Coragem.”; Carlos Freitas: “Na rua luta-se pela Liberdade.”; Brito Moura: “Democracia.”; e, quando o intérprete já repetia e construía o conjunto de palavras, uma senhora, sem se identificar, soltou com uma vontade que pareceu irreprimível: “Igualdade!”. Depois de repetida pelo intérprete, o espetáculo encerrou com a chave cartográfica de transmissão: Sofrimento. Guerra. Paz. Liberdade. Paz, sim. Guerra, não. Coragem. Na rua luta-se pela Liberdade. Democracia. Igualdade!
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